sábado, maio 19, 2007

Sou espírita, mas não sou santo...

Li um tópico sobre essa frase numa comunidade espírita do Orkut e resolvi tecer alguns comentários. A maioria de nós, já escutou essa frase, sempre expressa no sentido de uma desculpa prévia por alguma grosseria, irritabilidade, impaciência, mágoa e até mesmo ira.

Certamente não somos perfeitos! E que tem isso em relação à nossa doutrina? Será verdade que é cobrado mais do espírita que de outros religiosos? Creio que sim. Eu mesmo já escutei diversas vezes nos meus deslizes emocionais a expressão: " ...e ele é espírita..." Nessas situações somos constrangidos a responder com a expressão acima: "É verdade, sou espírita! Entretanto não sou santo!"

O risco que se corre é o risco da Justificação viciosa, isto é sob o argumento de que não se é perfeito, vamos nos deixando levar pelos nossos hábitos de vidas passadas quando obedecíamos a nossa natureza impulsiva e irada.

Qual o objetivo da reencarnação? Diz a resposta da questão 132 de "O Livro dos Espíritos" :

"Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta."

A resposta pode ser resumida em duas expressões: expiação e prova!

"Sofrer as vicissitudes da vida corporal." O que significa isso? Estar limitado física e/ou psiquicamente de modo a inibir a nossa compulsão para o erro, os nossos vícios. São as expiações restrições involuntárias. São determinadas por promotores da espiritualidade de modo a bloquear os hábitos que a maneira de programas informatizados, instalamos em nossos perispíritos na sucessão das existências sucessivas e solidárias. As limitações biológicas, seja nos membros, seja no cérebro bloqueia a nossa via do erro. Nossa predisposição a errar está então travada. Suicidas contumazes não mais o praticam sem os membros superiores, vigaristas, jogadores, drogadictos, todos compulsivamente enovelados na trama das reencarnações tem bloqueios neurológicos que lhes inibem a repetição. Estas vidas limitadas física e mentalmente são acompanhadas de outros aprendizados. São treinos na humildade, na paciência das fisioterapias, fonoaudiologias, psicopedagogias, todas levadas a cabo por heroínas das libertações das almas caídas.

A expiação é assim, uma educação corretiva, um processo de cura da alma, pois se por um lado mutila a carne, liberta-se o espírito.

A provação é outra classe de restrição biopsíquica, pois é voluntária. A prova é o momento do testemunho diante de Deus e dos homens. É o momento de viver as penas do corpo, para provar a mudança de caráter. A prova é um estágio superior da nossa evolução, pelo menos em se tratando da faixa evolutiva mediana de nosso planeta. As missões são estágios ulteriores ainda pouco comuns ao ser humano. Somos uma humanidade em expiação e provas, uns ainda involuntariamente bloqueados nas práticas dos seus erros prediletos, outros conscientemente deliberados a restringir as liberdades e facilidades da vida, para desenvolver os atributos mais nobres da humildade, da caridade, da espiritualidade.

Não sou santo, no entanto sou espírita! Essa nova arrumação das palavras nos permite cumprir a primeira sentença da resposta à questão 132: "Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição."


Não somos santos, mas devemos a cada dia depurar a nossa mente. Bem aventurados os puros de coração! Isto é, Felizes os que destilam a sua alma das paixões viciosas. Felizes os que trabalham no esclarecimento de si mesmos, reprimindo a revolta da alma, reprimindo o sentimento de mágoa, reprimindo o hábito da crítica ácida, da ironia, os momentos de irritabilidade. E como fazer isso? Exercitando-se nas pequenas ocorrências de nossa vida diuturna. É na prática diária da tolerância com os nossos irmãos adversários que sentiremos a mão delicada de Deus, oferecendo-nos oportunidades para treinar a paciência e o perdão. É na permanência no ambiente aparentemente desfavorável do nosso trabalho, de nossa família, de nossa instituição religiosa que exercitaremos a humildade, a tolerância, a esperança e desse modo, corrigiremos lentamente, progressivamente nossas viciações psíquicas de milênios no egoísmo. Humilhações, frustrações, dificuldades, fazem parte do repertório de nossas necessidades anímicas que devem nos induzir a repensar a frase e inverter a ordem nessa nova forma: Não sou um santo, mas como espírita, exercitarei a paciência. Não sou um santo, mas como espírita, exercitarei a tolerância.

Não sou um santo, mas como espírita, exercitarei o esquecimento das mágoas, a princípio forçando a minha natureza, depois sendo perdoador por natureza.

Diz Pietro Ubaldi, que a evolução de nosso psiquismo será tal que no futuro, o amor será instintivo.

O capítulo 17 de "O Evangelho Segundo o Espiritismo", de Allan Kardec, tem uma inesquecível passagem sempre recordada pelos que estão nessa laboriosa tentativa de conversão psíquica:

"Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más."

Em outras palavras poderíamos dizer: O verdadeiro espírita é aquele que tem uma imagem sincera de si mesmo, sabe mirar-se no espelho da autoconsciência e emprega todas as forças possíveis para reprimir seus momentos de falta de moderação, de falta de calma, de falta de perdão, de falta de piedade, de falta de paciência.

Somos constrangidos à prática do bem e é por isso que o Mahatma Gandhi, ao responder a uma pergunta de um repórter, se era um santo que queria ser político, respondeu com presença de espírito notável:


“Os homens dizem que eu sou um santo, perdendo-me a mim mesmo em política. O fato é que eu sou um político fazendo o máximo possível para ser um santo” (Gandhi apud Fischer, 1984).

3 comentários:

Juliana Tavares disse...

Pai,
muito bom o texto! Aliás, a cada dia estão melhores! Bem, temos que nos livrar desse comodismo de sempre nos desculparmos por não sermos santos. É preciso mudar de atitudes para um dia chegarmos a ser!
Beijos,
Juliana

Celso Vicente disse...

Flávio: seu texto me impressionou bastante e sugiro que o transforme num tema para pregação! Parabéns, irmão!

Anônimo disse...

Flavio,excelente o texto e seu comentario.Depois que tive a felicidade de conhecer a Doutrina atraves de nossa maravilhosa Escola,sinto necessidade diaria de melhora e ouço muito essa frase.Agradeço a Deus pela oportunidade de crescimento e que a cada dia possa encontrar forças para continuar.Obrigada a voces todos da Escola Jesus Cristo.