Meus amigos,
hoje, 02 de abril, o centenário de Chico Xavier coincidiu com a data móvel quando se celebra a Paixão de Jesus.
Coincidência ou não, foi uma importantíssima confluência de datas , pois a vida de Chico Xavier, no século XX, foi uma das que mais se aproximou de Jesus.
A Paixão de Jesus Cristo não foi apenas a tortura romana e a cruz, foi toda a sua encarnação.
E imitação da Paixão, vivida por Chico Xavier foi também a sua vida inteira.
Reproduzo, assim, o último capítulo de "Cália Lucius, Santa Marina", que é uma homenagem ao maior médium de todos os tempos: Chico Xavier!
"Quem é este, pois?"
Vivemos uma época de supercomunicação. Há possibilidade de comunicação instantânea e de acesso absoluto em todo o globo. Isto significa que não há região no planeta não coberta por satélite. A tecnologia já permitiu ao homem a onisciência e a onipresença.
A questão que examinamos, entretanto, é a surpreendente habilidade de Francisco Cândido Xavier de vivenciar nele mesmo uma hipermídia. Converteu-se a si mesmo em canal de intercomunicação. Através de sua complexa e avançadíssima rede de neurônios, em que incontáveis sinapses são ativadas simultaneamente, tornou-se ele o interexistente como dizia Herculano Pires. As referidas sinapses produzem um fenômeno elétrico em seu cérebro já estudado pelo nosso caro Dr. Elias Barbosa. Por que, entretanto evidenciar o fenômeno Chico Xavier entre inúmeros outros medianeiros da espiritualidade? A resposta está no paradoxo proposto por Jesus:
"Todo aquele que exaltar-se a si mesmo será humilhado. Todo que humilhar-se será exaltado.”
Chico foi um arquétipo da humildade. E não obstante o respeito a todos os demais intérpretes da espiritualidade na nossa terra, ninguém destacou-se de tal modo pela humildade como o médium de Pedro Leopoldo. A prova é que Chico não ocupou-se com a publicação de suas obras. Esperava ele que os dirigentes espíritas em sua boa vontade, sintonizassem seus pensamentos com a boa vontade dos bons espíritos que dele haviam se servido para a produção literária. Disse-nos Paulo de Tarso no livro “Paulo e Estevão”: “Deus tem pressa do serviço bem feito.”
Os autores espirituais sempre tiveram pressa da publicação de seus escritos, entretanto a humildade de nosso Chico não atropelou o livre-arbítrio dos dirigentes espíritas. Estes últimos é que decidiram como e quando a publicação das obras. Chico compreendeu que seu dever maior era a renúncia da autonomia de sua organização física para que a obra se materializasse.
Todavia, quem foi este que transcomunicou poesia e prosa, ciência e filosofia, evangelização e romances épicos, psicofonia e efeitos físicos e se não fora ainda o bastante, acrescente-se a esse rol mediúnico, as mensagens particulares. Estas últimas eram sempre entregues no original às famílias e de tal forma despojou-se ele de sua produção que os historiadores espíritas a atualidade buscam na mídia televisiva e internet por pessoas que possuam originais psicografados pelo médium Xavier. Retorno então a pergunta feita sobre Jesus, dirigida agora para o nosso querido Chico:
“Quem é este, pois?”
Respondo: foi um homem que cumpriu a Primeira Revelação de Deus a Moisés, sendo antes de tudo um ser ético. Foi um homem que cumpriu com elegância a pregação da humildade e do despojamento da Segunda Revelação de Deus, trazida por Seu Filho. Foi um homem que seguiu à risca os conceitos do “Homem de Bem” proposto por Kardec no capítulo 17 de “O Evangelho Segundo o Espiritismo.”
O cumprimento das três revelações foi a condição da abertura psíquica que o tornou o interexistente.
No caso específico apresentado neste ensaio despretensioso, sobressai a figura surpreendente de Célia Lúcius. A certeza antecipada de Emmanuel/Chico Xavier de que os arquivos da Igreja seriam levantados por alguém, é a primeira grande percepção de nosso Chico. Esse alguém foi meu Pai, Clóvis Tavares.
É evidente que a epopéia vivida por Célia no segundo século da era cristã viesse a sofrer grandes alterações. Imaginemos o que se contou sobre o Irmão Marinho, convertida em Irmã Marina após a sua desencarnação? Converteu-se num mito e a sua lenda espalhou-se em muito pouco tempo e para localidades distantes. Quem por lá passava escutava a legendária estória de uma moça que seguindo os passos do pai, viúvo e piedoso, protegeu-se da maldade humana, refugiando-se num mosteiro para homens. O episódio era sui generis e contar algo inusitado sempre foi da têmpera humana. Considerada mártir pela Igreja, foi canonizada possivelmente no século IV ou V. Segundo a tradição Catalunha, a história da santa Marina é “de origem incerta. É venerada nos paises catalães e em todo o arco mediterrâneo. Como a maioria dos santos daqueles tempos, foi proclamada santa por ‘vox populi’, senso comum para beatificação sem necessidade de revisão eclesiástica.” Foi canonizada como mártir. Mártir da humildade e do perdão.
Os anos que sucederam a desencarnação de Célia Lúcius foram extremamente férteis na produção de lendas, tanto nas redondezas de Alexandria, no Egito, como na Capadócia, Líbano, Itália, Espanha e em algumas ilhas do Mediterrâneo. Foram férteis na elaboração de variantes do mito da Santa que vestiu-se de monge e foi acusada de prevaricar. Expulsa do convento, criou o menino e só após sua morte a verdade foi revelada. Não obstante, em linhas gerais, todas as tradições apresentarem esse enredo, há interessantes adendos que trazem de vez em quando informações úteis, assim como os Apócrifos em relação a Jesus. Uma das mais relevantes e que não ficou explícita no texto mediúnico: Célia amamentou os seus filhos adotivos!
Vou fazer um aparte neste capítulo de tributo à mediunidade excelente de Chico Xavier para, de uma certa forma, complementar um aspecto pouco explicado a respeito de como teria Célia Lúcius cuidado e nutrido dois recém nascidos em circunstâncias absolutamente desfavoráveis, quais sejam: após a sua expulsão do lar, pela ruas de Roma, pelo Esquilino, com suas ruas lúgubres e desconhecidas de uma jovem de origem nobre e no caminho de Nápoles, por toda a península itálica e atravessando o Mediterrâneo em direção à Alexandria. E anos depois, em Alexandria, extra-muros do Mosteiro, passando fome e frio, novamente com outro menino sob seus cuidados. Baseado nestas duas situações decididamente adversas, faço algumas considerações acerca da possibilidade de uma mãe não-biológica poder amamentar.
Quem conhece a história de Célia Lúcius, pode fazer as seguintes indagações:
1-Como Célia nutriu o bebê ao sair da casa de seu pai? Com leite não humano obtido pelo caminho com terceiros através de solicitação direta? Certamente que não. Emmanuel omite esse detalhe. Os arquivos católicos não conheceram essa parte de sua vida. Portanto, se ela não dispunha de leite humano ou de uma cabra que a acompanhasse, supõe-se que ela produziu leite em suas mamas.
2- Existe base científica para afirmar que Célia amamentou o seu filho ao seio?
Sim. Diz a médica Celestina Grazziotin , coordenadora do Banco de Leite Humano do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná e consultora internacional credenciada pelo International Board Consultant Lactation Examiners (IBCLE):
" Quando a mulher passa pelo processo normal de gestação, principalmente chegando a termo, a fisiologia da lactação ocorre naturalmente, com a ação de todos hormônios envolvidos desde o início da gravidez, preparando a glândula mamária para amamentação. Mesmo assim, muitas puérperas apresentam dificuldades devido a falta de informação, de apoio profissional e familiar competente. Imaginemos, então, como será o processo de lactação e amamentação para uma mulher que adota uma criança. A Lactação Adotiva refere-se à estimulação da produção láctea em uma mulher que nunca engravidou. Este processo envolve uma série de questões que exigem do profissional capacidade de aconselhamento e profundo conhecimento de anatomia, fisiologia, psicologia, e inclusive de farmacologia, patologia, etc. relacionadas a lactação que possam interferir positiva ou negativamente nos resultados É imprescindível que a mulher – mãe adotiva – demonstre um forte desejo em amamentar e consiga obter confiança em si e no profissional que a orienta, atitudes positivas e motivação facilitam todo processo, tanto para ela própria como para quem lhe dará apoio, como os familiares, com os quais terá que contar, para dispor até de tempo a dedicar às técnicas de estimulação e cuidados com a criança.”
Diz também o pediatra Marcus Renato de Carvalho, professor de Pediatria da UFRJ, de quem tive a honra de ser colega de turma na saudosa Nacional de Medicina:
“Na lactação adotiva, o essencial para produzir leite, é o estímulo freqüente da mama, que pode aumentar com a ordenha manual ou pelo emprego de adequadas bombas elétricas de extração. O estímulo da sucção aumenta os níveis de Ocitocina e Prolactina na mulher e como efeito secundário podem ser observadas irregularidades ou ausência de menstruação, o que comprova que o processo está indo bem.”
3-Existem, enfim, estatísticas sobre a possibilidade de um nascituro na idade antiga sobreviver à epidemias e a doenças comuns da infância, principalmente em países frios, sem aleitamento materno?
Penso que seria quase impossível a adaptação de um recém-nato a este mundo, nas condições em que o primeiro filho adotivo de Célia foi recebido, sem a proteção fisiológica de um leite materno, rico de anticorpos e elementos essenciais não presentes em um leite heterólogo, isto é de outra espécie animal. Esta opinião é compartilhada pelo meu amigo Marcus Renato e pelo meu irmão Luís Alberto Mussa Tavares, também pediatra, neonatologista, que acompanha muitos casos de prematuros e os apresenta em seu blog pessoal , as possibilidades de um bebê não alimentado ao seio contaminar-se com as infecções comuns da primeira infância são muito grandes. Considerando as condições sanitárias da Europa no século II, as possibilidades de infecção eram muito maiores.
Por isso, cremos nas tradições maronitas que alegam que a Santa Marina amamentou o seu filho adotivo. E como eles não conheceram a história do primeiro filho adotivo de Célia Lúcius, cremos que ela amamentou os seus dois filhos adotivos.
No texto bíblico há o caso de Noemi, cuja nora dá a luz um filho que é amamentado por ela, que era a avó:
“Então as mulheres disseram a Noemi: Bendito seja o Senhor, que não deixou hoje de te dar remidor, e seja o seu nome afamado em Israel. Ele te será por restaurador da alma, e nutrirá a tua velhice, pois tua nora, que te ama, o deu à luz, e ela te é melhor do que sete filhos. E Noemi tomou o filho, e o pôs no seu colo, e foi sua ama.”
(ou : “o amamentou”, segundo algumas traduções).” Rute 4:16.
Considerando agora os mitos e as lendas que se proliferaram na hagiografia sobre a Santa Marina, construí um pequeno exercício de imaginação sobre a origem das discrepâncias histórias entre a história narrada em “50 Anos Depois” e os relatos católicos e maronitas.
Estamos em Alexandria e já se passaram 5 anos após o desaparecimento do Irmão Marinho, transformado em Irmã Marina. Já se fala que era filha de um homem piedoso e viúvo e que ali se instalara para refugiar-se da maldade humana assim que seu pai falecera. O Pai Epifânio não soube que Helvídio era o pai do Irmão Marinho. A única informação que ele obteve foi que este era filho de seu amigo Lésio Munácio. Acredita-se que a construção da lenda parte da informação parcial e equivocada que foi transmitida oralmente por Epifânio e pelos monges do Mosteiro.
A passagem de muitos romeiros pela grande cidade egípcia facultou a disseminação do mito. Nas ilhas do Mediterrâneo, passados mais 10 ou 20 anos, contava-se que a moça era natural de Chipre, de colonização grega. Navegantes do mar Mediterrâneo levaram a lenda para terras espanholas onde conta-se a história de uma Santa Marina que morou em Alexandria e cuja memória é viva na cidade catalã de Pratdip.
Mercadores árabes levaram a lenda para a Palestina e nos planaltos do Líbano, onde vários mosteiros cristãos ergueram-se nos séculos seguintes, houve a incorporação desta legendária santa que vestida como monge, enfrentou a calúnia com humildade e indulgência. Surgiu assim a história de uma Santa Marina na Bitínia, mais especificamente no Mosteiro de Quannoubin, no Vale Qadisha, atual Líbano. Denomina-se Santa Marina da Bitínia, Santa Marina Libanesa ou do Quannoubin.
Até mesmo os padres do deserto, que praticavam a oração como exercício místico de busca da permanência de imanência divina (Hesicasmo), contaram a história de Célia divulgando-as para os peregrinos russos.
Evidentemente a primeira parte da história de Célia é absolutamente inacessível. E mesmo entendendo a interexistência de nosso Chico, ainda quedamos perplexos e ficamos a indagar de nós mesmos:
“Quem é este, pois?”
À época da captação destas páginas Chico era um funcionário da Fazenda Modelo, de Pedro Leopoldo. Esta fazenda dista do centro da cidade alguns kilômetros. Este trecho Chico percorria diariamente a pé ou em charrete, acrescentando algumas horas a mais em sua jornada de trabalho diário. Chegando à casa, tinha ele afazeres domésticos, além das reuniões públicas do Grupo Luiz Gonzaga.
Sabe-se que além dessa exigüidade de tempo, que os meios de se adquirir informações minuciosas, como a respeito de uma santa desconhecida do público brasileiro eram reduzidíssimos. Quem poderia de antemão, produzir uma narrativa riquíssima de dados inacessíveis, que pode após alguns anos ser confirmada pela hagiografia?
Como é fácil nos nossos dias, recompor a história de Célia, fazendo as analogias entre o livro de Emmanuel e os registros advindos de fontes tão diversas como a igreja Maronita do Líbano e uma pequena cidade da Catalunha! Como é simples o acesso à internet aos domínios dessas Igrejas e Prefeituras, acessar história, fotos, monumentos, que somente podem confirmar o que a mediunidade prodigiosa de nosso Chico alcançou de modo cristalino e rico de informações.
Como entender esse cérebro conectado em banda larga com altíssimas freqüências espirituais, de modo a recompor com detalhes históricos e particulares, esta epopéia encantadora revelada por Emmanuel?
Quem é esta potência da hipermídia que converteu-se a si mesmo num atestado de Imortalidade?
Portanto, que nós outros, legatários desse manancial inesgotável que é a bibliografia xaveriana, voltemos o olhar para Deus e agradeçamos a ventura de termos romances como o “50 Anos Depois” que, certamente, alcançam ares da sensibilidade de muitas almas encarnadas, que readquirem esperança e coragem para suportar aflições, para tolerar injustiças e para almejar a própria regeneração.
Paciência, humildade e fé não são dons comuns ao ser humano. São conquistas espirituais. Enquanto não tivermos estes três dons divinos intrínsecos em nossos espíritos, necessitamos de ler exemplos de vida como o de Célia Lúcius. Precisamos conhecer espíritos como foi Chico Xavier, para que nos estimulemos espiritualmente. Precisamos exercitar a Paciência, através dos contratempos da vida, aprendendo a tolerá-los. Precisamos exercitar a Humildade no decorrer das humilhações que necessariamente sofreremos, convertendo-as em aprendizado do espírito. E finalmente, necessitamos alcançara a Fé, suprimindo o Medo que habita em nosso espírito.
Exemplos como o de Célia Lúcius/Santa Marina, revestem-se de uma estranha força capaz de arrastar os desanimados, entusiasmar os pusilânimes e encorajar os tímidos, recompondo seus psiquismos, reestruturando suas predisposições, na conquista da certeza de que nossa biografia é infinita.