“Levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo” Gl 6: 2
O livro de Chico Xavier/Herculano Pires, “Diálogo dos Vivos” tem no capítulo 11 uma questão sobre a oração, sua necessidade real e sua utilidade para o homem. André Luiz brinda os presentes com a mensagem Oração para não Incomodar. Ao final, Herculano Pires faz um excelente comentário sobre a mecânica da oração e o melhor meio de utilizá-la.
É certo que nós vivemos neste mundo muito bem identificados com as nossas funções e necessidades biológicas. Segundo Maslow, psiquiatra americano, as necessidades do homem partem das necessidades básicas, digo, biológicas, continuam com as necessidades físicas como exercícios respiratórios e musculares, continuam com a necessidade de trabalho material, depois com a necessidade de relação humana, carinho, afeto, depois vem a produção artística, cultural ou científica e por fim a necessidade de transcendência que vem com a prática da oração. Na verdade estas funções estão ligadas aos centros de força ou chacras do corpo perispiritual. De acordo com a medicina da alma, à medida que o espírito evolui há uma tendência de reduzir as funções dos chacras básicos e aumentar as funções superiores da alma. Do ponto de vista biológico, o homem como epifenômeno, é o resultado da crescente cerebralização das espécies pela Lei de Evolução. Ontologicamente, o homem recapitula até a puberdade, todas as etapas da evolução biológica, dos uni celulares até o ser humano completo ao momento do parto. A partir da puberdade, completa a recapitulação filogenética, tem início uma recapitulação chamada palingenética, que é a recapitulação de nossas próprias experiências, de nossas próprias vivências, erros e acertos, que são temperados pelos ensinamentos da primeira infância.
Espíritos superiores passam a maior parte de sua vida , usando seus chacras mais altos, em contato com o mundo espiritual e de vem em quando “encarnam”, isto é, identificam-se mais com o seu corpo, como nós, sentem-se na “aridez espiritual”, como dizia S.Tereza D´Avilla. Estas pessoas vivem quase que como levitando, desdobradas, em outro estado de consciência, vivendo uma realidade mais sutil que os demais, deixando de sofrer algumas grosserias da materialidade, por não sentir necessidade delas e sofrendo, por estar num estado de hipersensibilidade emotiva maior que os demais.
Os seres humanos comuns, como nós, vivemos, quase que a totalidade do nosso tempo terreno, identificados quase que totalmente com as nossas necessidades físicas e apenas no período do sono, nos desconectamos da materialidade. Uma determinada porcentagem destas, nem desprendem-se por completo, permanecem ligados ao corpo. Através do desenvolvimento da prática da oração, mesmo com orações repetidas, recitadas, com a sua respiração pausada pela repetição vocal, entramos em ligeiro estado alterado de consciência, o que nos eleva a atividade espiritual. Se usamos a possibilidade de orar, para comunicarmo-nos racionalmente, voluntariamente com o nosso criador, a nossa vida vai progressivamente se tornam do mais espiritual.
Na verdade, vivemos muitas vidas para nos despojarmos de muitos fardos. Em Gálatas 6, Paulo nos dá duas advertências: “Levai as cargas uns dos outros” no verso 2. Isto confirma que todos nós temos cargas, temos fardos. No verso 5 ele diz : “Cada qual levará a sua carga”. E mais adiante: “ Não Erreis. Deus não se deixa enganar. O que o home semear, isso mesmo colherá.”
Imaginemos então que cada corpo que assumimos em uma encarnação é um caminhão de carga. Trazemos uma carga, por exemplo, de tijolos que é formada por várias atitudes repetidas por nós em outras existências, que precisamos descarregar nesta atual. Vivemos no intuito principal de nos livrarmos de pesos na alma, muitas vezes transferindo-os para o nosso corpo, na forma de mutilações e repressões do corpo. Isso possibilita nos desprendermos de nosso mal hábito, como se estivéssemos internados numa clínica para dependentes químicos, impedidos de usar a droga. Outras vezes a carga vem na forma de dificuldades sociais, morais, deficiências cognitivas, parentes difíceis, colegas de trabalho, situações das quais pensamos muitas vezes em fugir. Entretanto se dela nos esquivarmos, deixaremos de descarregar a nossa carga, o nosso fardo. Mas como todo caminhão de carga, ele não deve apenas descarregar e retornar ao seu ponto de partida, deve voltar com uma carga também. Se a nossa descarga, chamamos de carma, a nossa carga de retorno podemos chamar de darma, pela terminologia hindu. O que chamamos carma é a lei de causa e efeito, as conseqüências naturais de nossos atos. Pietro Ubaldi também a isso se referiu dizendo : “A Semeadura é livre; a Colheita obrigatória.” Outras vezes temos uma carga que é um pensamento contido, por um temperamento tímido, recatado, mas que por dentro guarda uma raiva, um ressentimento. Um dia essa fúria pode se desprender de dentro de nós. É também o carma, pois cultivamos essa ação em diversas vidas e delas somos refém na atual. Precisamos de um corpo com temperamento melancólico, para não deixar a ira liberar-se, mas a força de sua ira interior pode eclodir por um motivo forte. Eu me recordo de que um pintor brasileiro, artista, votado para as artes refinadas da pintura clássica, um dia foi traído por seu próprio passado. Foi Iberê Camargo, que uma noite, ao sair de casa para comprar cigarros, após conversa com a esposa sobre os altos índices de violência, leva sua arma. Na rua presencia séria discussão de um casal e intervém em favor da moça humilhada. Começa uma discussão com o rapaz que o empurra, atirando-o ao chão. Instintivamente, movido pelo medo e por sua instintividade escondida, tira a sua arma, atira e mata o rapaz. Tudo muito rápido, mas apesar do corpo e da profissão totalmente inadaptados para a violência, a carga do passado reapareceu e o pintor não conseguiu passar esta vida de despojar-se dela.
Uma vez meu Pai, Clóvis Tavares pregou aqui, numa sexta feira, como hoje e falou sobre as possibilidades da oração. Disse que um empresário americano, protestante, esperava o tem numa estação. Ali estava também o seu pastor, com que se encontrara casualmente. Um aviso de que o trem se atrasaria levou os dois a entabularem uma conversa. Disse o empresário: - Sabe, Pastor, tenho lido a Bíblia todos os dias de minha vida, desde a minha juventude. Todo ano, eu termino com a consciência tranquila de haver lido a Bíblia completa. Mas uma coisa me arrasa. – O que é meu filho?, disse o pastor. – É que tenho pensamentos de ódio dentro de mim contra certas pessoas, inclusive de nossa comunidade. E não consigo desvencilhar-me deles. Respondeu o pastor: - Que bom seria, meu jovem se pudéssemos abrir o tampo de sua cabeça, uma trepanação, e limpar os seus pensamentos ruins, retirando-os com uma colher, não é mesmo? – Sim, pena que não seja possível, não é pastor? – É mesmo- respondeu o ministro. Pensou alguns minutos e falou o pastor: - Já sei! Não podemos abrir a sua cabeça, mas Deus fez o seu cérebro com janelas abertas para o meio. São os olhos, a boca e os ouvidos. Você tomará uma Bíblia, recortará versículos e os guardará no bolso. Cada vez que os pensamentos ruins eclodirem da sua mente, você lerá repetidamente o versículo da Bíblia, aleatoriamente retirado do bolso. E ficará lendo até que os pensamentos se afastem. Pensamento é uma substância. Dois corpos não ocupam o mesmo lugar. A leitura repetida do pensamento de Deus expulsará o seu pensamento ruim. O empresário uso o método das palavras da Bíblia como remédio de crise por três anos. Se compararmos o nosso estado espiritual doentio com uma doença crônica como a angina de peito e a asma, podemos dizer o seguinte. Assim como na asma e na angina há um tratamento contínuo e um medicamento de crise, isto é, o medicamento de uso continuado não impede que surja uma crise forte que exija uma medicação independente do tratamento que se faz. Assim também a doença da alma. Podemos ter uma vida espiritual , lendo estudando e praticando a caridade, mas não nos libertamos de um ataque espiritual e o despertamento de crises da alma, com dor e angústia, além de pensamentos maus que nos envolvem e nos fazem voltar a comportamentos já superados no passado próximo. São conquistas espirituais ainda muito débeis que podem se desvanecer num momento de ataque premeditado do mal. A leitura da palavra orientada do plano superior repetidas vezes vai retirar o ataque do mal como a substituição de uma praga virtual do computador. O remédio da crise tem que andar conosco para empregá-lo. Não precisamos recortar tiras de versículos do Novo Testamento. Podemos adquirir as Preciosas Promessas em qualquer livraria de artigos evangélicos e guardá-las na bolsa ou numa pasta e tê-las sempre à mão na crise espiritual. O empresário após três anos de luta espiritual contra os pensamentos que povoavam a sua mente e o atacavam episodicamente, conseguiu liberta-se deles. Podemos também , considerando que , como disse o apóstolo Tiago: “A oração feita por um justo, muito pode em seus efeitos.” E quem é o justo? Perguntou Clóvis Tavares em sua palestra de 1954? –É porventura o homem bom? Não! Não é apenas o homem bom. É o homem bom, mas é também aquele homem que quer ser bom. Quem quer melhorar, quem quer curar-se da grande enfermidade espiritual, precisa querer ser bom e exercitar a oração, usando as janelas da mente, lendo, dizendo as citações em voz alta e escutando a sua própria voz, de modo a eliminar , após muita perseverança, o mal que ainda é parte integrante de nossa corporalidade.