Que diferença há entre o êxtase e o sonambulismo?
O êxtase é um sonambulismo mais apurado. A alma do extático ainda é mais independente.
Livro dos Espíritos, questão 439
_É um assunto espírita esse? Você tem certeza? Parece-me um tanto místico! O Espiritismo não é uma ciência?
_Tanto é um tema espírita que é parte da Codificação. Veja a questão 439 e as seguintes, de que tratam elas?
_ È verdade, sempre achei que êxtase fosse algo místico!
_ E o que você tem contra o misticismo. Por acaso você é daqueles que confunde Misticismo com crendice ou mistificação?
_ E não é mesmo?
_Claro que não. Misticismo é uma forma muito evoluída de comunicação com as esferas superiores do pensamento divino. É a mais elevada forma de mediunidade que é conhecida pelo homem.
_Fale-me então:
Começarei pela análise de nossa Consciência. Nós temos uma consciência de superfície, que é o nosso pensamento, nosso entendimento e nossa vontade. E temos uma consciência profunda que determina atos de nosso corpo que acontecem independentemente de nossa vontade, como os movimentos intrínsecos de nosso órgãos no interior de nosso corpo. Essa nossa subconsciência é responsável também, por todos os nossos atos reflexos, que são aprendidos e integrados ao nosso automatismo. Aí estão as nossas rotinas e nossas principais reações aos diversos estímulos. Acham-se também aí registradas emoções que provém de um sentir íntimo muito profundo e que permanece na categoria de emoções básicas do ser humano, como medo, raiva, defesa, fome, preservação da espécie, busca do prazer e o seu inverso, a fuga da dor.
Há entretanto uma outra parte de nosso inconsciente que é formada por sentimentos e moções que não são básicos, mas que existem naturalmente em alguns seres humanos e que de acordo com alguns filósofos são o escopo da nossa natureza. São a solidariedade, a bondade, a humildade, o perdão, a fraternidade, o altruísmo, a concepção do belo, a busca da perfeição artística e científica, a espiritualidade, a busca do sagrado. Esse é o nosso Superconsciente.
Nascemos com o nosso subconsciente já talhado e forjado por várias experiências humanas através das vidas sucessivas. Temos um consciente aberto a novos aprendizados na terra. E um Superconsciente que funciona como elemento de ligação entre a nossa natureza e a divina. Através de nossas existências, os momentos de construção de nosso Superconsciente vão crescendo e tornando-se progressivamente mais marcantes em nossas vidas terrenas. Assim, seres primitivos são comandados em seu estado consciente, por sua instintividade residente no seu subconsciente. Seres humanos de média evolução ponderam e empregam o seu raciocínio lógico para formatar um novo grupo de ações que fará parte integrante de sue patrimônio psíquico. E os seres evoluídos, segundo o seu sentir, seu pensar e sua vontade que vêm da dimensão superconsciente de sua totalidade, conseguem superar a instintividade. Agem segundo padrões mais elevados da espécie humana, são notáveis por sua bondade, sua ética, sua autoridade moral. Em todos os séculos a nossa humanidade tem recebido alguns espíritos de escol que destacam-se dos demais, incentivando-os com os seus exemplos.
Esses espíritos que vivem num padrão mental mais elevado precisam receber das dimensões espirituais de onde vieram. Esses momentos são os chamados momentos de êxtase. Veja esta pergunta 440 O Livro dos Espíritos:
O Espírito do extático penetra realmente nos mundos superiores? "Vê esses mundos e compreende a felicidade dos que os habitam, donde lhe nasce o desejo de lá permanecer. Há, porém, mundos inacessíveis aos Espíritos que ainda não estão bastante purificados."
O Êxtase é um estado de arrebatamento espiritual íntimo que corresponde a um transe. Pode ser anímico, se auto-produzido ou mediúnico, se induzido por um espírito desencarnado. Ele difere do sonambulismo pela superioridade de suas manifestações. Enquanto o sonambulismo afeta as pessoas de um modo pouco produtivo espiritualmente, o êxtase vislumbra uma ultra-realidade a qual tem acesso por um momento e da qual o extático pretende trazer notícias ou revelações. É entretanto, da mesma maneira que o estado sonambúlico, um estado alterado de consciência, que se dá pela exteriorização do perispírito, isto é , uma experiência fora do corpo, OBE, em inglês.
É um estado de independência da alma com um progressivo e profundo aniquilamento do corpo, que desce ao nível de um metabolismo basal. Paralelamente a este momento de limiar da vida para o corpo, experimenta a alma uma leveza indescritível, uma paz inenarrável, uma emoção inefável, ausência de medo ou preocupações, ausência de qualquer dor, ansiedade, angústia, percepção de espaço ou tempo.
Exemplos de espíritos que atingiram momentos de êxtase são Paulo de Tarso, que foi arrebatado a região que denominou terceiro céu, e que podemos entender como uma ultra-dimensão da consciência, onde a paz e a liberdade de pensamento lhe conferiram uma provável vontade de lá permanecer.
"Importa que me glorie? Na verdade, não convém! Passarei, entretanto, às visões e revelações do Senhor. Conheço um homem em Cristo que há catorze anos foi arrebatado até o terceiro céu. Se foi no corpo, não sei. Se fora do corpo, também não sei; Deus o sabe.
E sei que esse homem - se no corpo ou se fora do corpo, não sei; Deus o sabe - foi arrebatado ao paraíso e lá ouviu palavras inefáveis, que não é permitido a um homem repetir." II Cor 12:1-4
E foi assim, que ele só retornou à nossa dimensão da realidade, sentindo a pressão da dor física, dor essa que ele no sétimo versículo do mesmo capítulo acima, define como um bofetão do mal. "
"Demais, para que a grandeza das revelações não me levasse ao orgulho, foi-me dado um espinho na carne, um anjo de Satanás para me esbofetear e me livrar do perigo da vaidade.
Paulo, o grande apóstolo dos Gentios, temeu a possibilidade de que a exaltação da glória do arrebatamento psíquico lhe levasse a uma queda moral.
Outros exemplos, podemos citar de Mediunidade dos Santos, de Clóvis Tavares, que descreve os êxtases de S. Teresa d´Avilla, de S. João da Cruz, de S. Pedro de Alcântara, de Dom Bosco, S. Francisco e outros.
Há que citar também as personalidades do século XX que não foram espíritas, mas que divisaram através de mediunidades próprias, êxtases místicos com revelações sempre renovadoras para nossas almas. Foram Edgar Cayce, nos Estados Unidos e Pietro Ubaldi, na Itália e no Brasil Este último, explica no formidável As Noúres, a técnica de sintonia com a correntes de pensamento situadas nas regiões que ele denominou ultrafânicas.
Kardec nos informa que o extático corre riscos.
Se se deixasse o extático entregue a si mesmo, poderia sua alma abandonar definitivamente o corpo?
"Perfeitamente, poderia morrer. Por isso é que preciso se torna chamá-lo a voltar, apelando para tudo o que o prende a este mundo, fazendo-lhe sobretudo compreender que a maneira mais certa de não ficar lá, onde vê que seria feliz, consistiria em partir a cadeia que o tem preso ao
planeta terreno." L.E. 442
A condição espiritual é periclitante. Encontra-se numa faixa de vibração muito próxima da libertação total da alma e a sensação é prazerosa. é sensação de total mergulho na paz, o que os orientais denominam Samadhi.
Ademais do risco de vida, o extático corre o risco da fascinação, pois o seu retorno à nossa realidade física pode ser transtornado por espíritos obsessores que visam produzir ruído espiritual enganoso na revelação.
Pretendendo que lhe é dado ver coisas que evidentemente são produto de uma imaginação que as crenças e prejuízos terrestres impressionaram, não será justo concluir-se que nem tudo o que o extático vê é real?
"O que o extático vê é real para ele. Mas, como seu Espírito se conserva sempre debaixo da influência das idéias terrenas, pode acontecer que veja a seu modo, ou melhor, que exprima o que vê numa linguagem moldada pelos preconceitos e idéias de que se acha imbuído, ou, então, pelos
vossos preconceitos e idéias, a fim de ser mais bem compreendido. Neste sentido, principalmente, é que lhe sucede errar." LE 443
Que confiança se pode depositar nas revelações dos extáticos?
"O extático está sujeito a enganar-se muito freqüentemente, sobretudo quando pretende penetrar no que deva continuar a ser mistério para o homem, porque, então, se deixa levar pela corrente das suas próprias idéias, ou se torna joguete de Espíritos mistificadores, que se aproveitam da sua exaltação para fasciná-lo." LE 444
Assim, o fenômeno do Êxtase é um dos mais complexos já produzidos na fenomenologia psíquica e que é próprio de almas sensibilizadas pelo sofrimento, pelo amor e curtidas com muita humildade e coragem.